Destreza, malícia, a dança guerreira.
Luta de escravos em busca da liberdade; luta, dissimulada na elegância de gestos quase sagrados, na descontração alegre e galhofeira do espetáculo.
Espetáculo sublime, quando estão em harmonia o toque do berimbau, os demais instrumentos, a voz do mestre, o coro polifônico, a dança dos dois guerreiros e a emoção do perigo real, sempre à espreita, à espera do momento certo, o bote fatal.
Jogo, dança, luta.
Axé.
O Jogo de Capoeira nasceu sob o signo da Libertação. Nunca nos devemos esquecer disto.
É um jogo complexo, que funde a música e a movimentação corporal num todo harmônico. É dança, é canto, é jogo de habilidade e destreza corporal, mas também é luta, e das mais terríveis.
Na definição técnica do dr. Ângelo Augusto Decanio Filho, temos que “a capoeira baiana é um processo dinâmico, coreográfico, desenvolvido por dois parceiros, caracterizado pela associação de movimentos rituais, executados em sintonia com o ritmo ijexá [1][1], regido pelo toque do berimbau, simulando intenções de ataque, defesa e esquiva, ao tempo em que exibe habilidade, força e autoconfiança, em colaboração com o parceiro do jogo, pretendendo cada qual demonstrar sua superioridade sobre o companheiro. O complexo coreográfico se desenvolve a partir de um movimento básico denominado gingado [1][2], do qual surgem os demais num desenrolar aparentemente espontâneo e natural, porém com um objetivo dissimulado de obrigar o seu parceiro a admitir a própria inferioridade”.
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[2][1] a) Ramo da nação nagô, formado por mulheres dissidentes, com rituais religiosos específicos.
b) Ritmo musical de candomblé, usado no culto de Oxum, Oxalá, Nana Borokô, Nhançan, Yemanjá, Logunedé, Ogum, Oxosse, etc; lento, suave, calmo e majestoso
[1][2] Movimento ritmado de todo o corpo acompanhando o toque do berimbau, com a finalidade precípua de manter o corpo relaxado e o centro de gravidade do corpo em permanente deslocamento, pronto para esquiva, ataque, contra-ataque ou fuga. É o fulcro da capoeira, donde partem todos os seus movimentos. Durante o gingado, o praticante deve manter-se em movimento permanente, simulando tentativas de ataque e contra-ataque, sempre atento às intenções do parceiro, em contínua postura mental de esquiva e proteção dos alvos potenciais de ataques.
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Ainda segundo Mestre Decanio, "Todos os movimentos possíveis do corpo humano são admissíveis no jogo da capoeira, desde que realizados a partir do gingado, em concordância com o toque do berimbau, enquadrados no ritual e não acarretem riscos de lesões ou prejuízo moral ao parceiro, aos demais participantes e/ou aos assistentes."